Aluguel já é quase um quarto dos domicílios no país, e percentual de casas próprias cai
em O Globo / Economia, 22/agosto
Fatia dos lares alugados subiu de 18,4% para 23% em oito anos. Situação evidencia concentração de riqueza, diz IBGE.
Embora o rendimento médio da população esteja aumentando nos últimos anos, o sonho de conquistar a casa própria ainda é uma realidade distante para boa parte dos brasileiros. Dos 77,3 milhões de domicílios particulares permanentes estimados no país em 2024, 17,8 milhões eram alugados, o equivalente a 23% do total. Em 2016, o percentual era de 18%.
Já a fatia de casas próprias não para de cair: saiu de 73% há oito anos, incluindo imóveis já pagos e com financiamento ainda não quitado, para 67,6% no ano passado. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua: Características Gerais dos Domicílios e Moradores 2024, divulgada pelo IBGE nesta sexta-feira. A pesquisa foi iniciada em 2016.
Embora o número de lares alugados ainda seja consideravelmente menor do que o de casas próprias, os alugueis cresceram bem mais nos últimos oito anos. Desde 2016, houve um salto de 45,4% na quantidade de imóveis em que os moradores viviam de aluguel.
Além das categorias de imóveis próprios e alugados, há ainda os cedidos, que representaram 9% do total em 2024, e aqueles em outra condição (0,2%), que inclui os casos de invasão, por exemplo.
Concentração de riqueza
O analista do IBGE William Kratochwill explica que os números evidenciam que há uma concentração de riqueza no país, pois o imóvel próprio, ainda que maioria, está nas mãos de cada vez menos gente.
— Essa questão do aumento de concentração é algo histórico e social, porque não se criam oportunidades para a população adquirir o seu imóvel. A pessoa continua querendo ter sua independência, mas não consegue adquirir um bem, então tem que partir para o aluguel.
Ele explica ainda que o processo longo de inflação e baixos salários cria mais dificuldades para as pessoas aumentarem seu patrimônio, assim como a falta de mais de políticas públicas de casa própria. Na visão do especialista, os recentes aumentos no rendimento médio na população ainda não foram suficientes para ampliar seu acesso à compra de imóveis.
— Para que as pessoas tenham condições de evoluir e adquirir seu imóvel, isso tem que se manter a longo prazo — concluiu.
Marilete Lima, de 55 anos, está entre os brasileiros que sonham com a casa própria, mas não conseguem incluí-la em seu orçamento. Com a renda de um salário mínimo, ela mora de aluguel com a filha em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, e chegou a fazer simulações de compra de imóveis, mas as entradas e juros elevados a distanciaram de seu objetivo.
— Estou há mais de 30 anos pagando R$ 1.300 de aluguel nesta mesma casa, e as pessoas falam que com isso eu já poderia ter comprado uma casa. Mas quando você vai fazer a simulação, o juro é tão alto, fica uma coisa fora do normal.
Ela conta que encontrou uma casa à venda no valor de R$ 180 mil, mas que exigia uma entrada acima de seu orçamento. Mesmo recorrendo a financiamentos, Merilete fez as contas e percebeu que não conseguiria arcar com as despesas.
— Você vai pagar as prestações e uma casa de R$ 200 mil vai sair a quase R$ 600 mil, o que é muito maior do que você tem para dar. Aí, quando você vê, já está com 50 anos e ainda não conseguiu uma casa própria. As pessoas falam que você não tem porque não quer, mas não tem possibilidade.
Apartamentos se multiplicam
A pesquisa mostra ainda que a maioria da população reside em casas, que corresponderam a 84,5% do total de domicílios, ao passo em que os apartamentos totalizavam 15,3%. No entanto, de 2016 para 2024, o número de apartamentos cresceu 29,8%, enquanto o de casas cresceu apenas 13,8%. Dessa forma, os números evidenciam um declínio no percentual de casas e aumento dos apartamentos.
Kratochwill explica que o movimento faz parte do processo de concentração urbana, já que as pessoas querem cada vez mais viver em local próximo ao trabalho, aos serviços, e aos benefícios que o centro urbano produz.
— Como o espaço é limitado, a maneira é construir imóveis um em cima do outro, em um mesmo espaço de terra, o que acaba gerando redução de custos. Isso incentiva a construção de apartamentos em detrimento de casas.
A região com o maior percentual de apartamentos foi o Sudeste, com 19,8%, enquanto o Norte tinha apenas 8% de seus domicílios como apartamento.
Idosos são 40,5% das pessoas que moram sozinhas
O número de lares com pessoas morando sozinhas, chamados de unipessoais, vem crescendo no país na última década. Se em 2012, quando essa característica começou a ser pesquisada pelo IBGE, eram 7,45 milhões, esse número quase dobrou em 2024, chegando a 14,38 milhões. Já a parcela das moradias unipessoais no total dos domicílios saiu de 12,2% para 18,6% nesse intervalo de tempo.
Ainda assim, as famílias nucleares — que podem ser constituídas por um casal, com filhos ou não, ou por um responsável com filhos — continuam sendo o arranjo mais comum no país, representando 65,7% do total de domicílios. Esse percentual caiu desde 2012, quando alcançava 68,4% dos lares.
Nesse universo, outro dado chama atenção: entre aqueles que moram sozinhos, 40,5% são idosos. O analista da pesquisa explica que esse número reforça a tendência de envelhecimento da população, que já vem sendo observada em outros dados divulgados pelo IBGE.
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