A famosa mansão da Lagoa destombada pelo STF e uma das últimas residências antigas à beira do espelho d’água, já não existe mais. Depois de quase duas décadas de disputa judicial, o imóvel que ocupava a esquina da Avenida Epitácio Pessoa com a Rua Joana Angélica foi completamente demolido nesta sexta-feira (28/11). Construída no início dos anos 30, a casa ganhou destaque noticiário em agosto, quando o DIÁRIO DO RIO revelou com exclusividade o cancelamento de seu tombamento municipal, decisão que abriu caminho para a derrubada definitiva da estrutura.
Um dos últimos casarões da Lagoa
O processo que levou ao fim da Casa de Pedra começou ainda em 2007. A disputa opôs a Prefeitura do Rio e os herdeiros do empresário Ricardo Haddad, dono da antiga Fábrica Bangu e responsável por um extenso patrimônio familiar na cidade. Eles contestavam o tombamento decretado em 2002 pelo então prefeito César Maia, que colocou a residência e outras oito edificações baixas da orla da Lagoa sob proteção municipal.
A briga se arrastou por instâncias e recursos sucessivos. A Procuradoria Geral do Município ainda tentou reverter decisões favoráveis à família, porém em março deste ano os ministros do STF encerraram o curso do litígio ao rejeitar o último recurso da prefeitura. Com o caso devolvido à Justiça do Rio, a defesa dos proprietários solicitou formalmente que o imóvel fosse retirado da lista de bens tombados, e pouco depois entrou com o pedido de demolição.
Terreno avaliado em R$ 130 milhões
A queda da casa consolidou o destino do terreno, avaliado em cerca de R$ 130 milhões e localizado em uma das áreas mais valorizadas de Ipanema. O lote ao lado, que pertenceu ao restaurante Chico’s Bar, permanece vazio e integra e é de propriedade da mesma família.
Mesmo sem confirmação oficial de venda para alguma construtora, já circulam projetos estudados para ocupar o endereço. O mais avançado atende pelo nome L’Unique Lagoa e prevê apartamentos partindo de R$ 20,4 milhões, além de uma cobertura duplex que começaria em R$ 36 milhões. Caso vá adiante, o lançamento terá valor estimado de R$ 60 mil por metro quadrado — índice 170% acima da média atual de Ipanema, hoje por volta de R$ 22 mil/m². Seria, portanto, o empreendimento mais caro da Lagoa nos últimos anos, com preços semelhantes aos negociados na Delfim Moreira, no Leblon, considerado o metro quadrado mais valioso da América Latina.
Quem é a família Haddad
A família Haddad ganhou destaque no mapa econômico do Rio nos anos 1990, quando Ricardo Haddad adquiriu a Fábrica de Tecidos Bangu e herdou todo o conjunto patrimonial da antiga família Silveira, proprietária original do complexo. O espólio incluía mais de duzentas casas espalhadas por bairros inteiros da Zona Oeste, como Bangu, Padre Miguel, Realengo e Magalhães Bastos, formando um dos maiores domínios privados da região.
Anos mais tarde, ele tentou negociar a antiga mansão do Dr. Silveirinha, símbolo máximo daquele ciclo industrial. Primeiro para um grupo supermercadista, depois para uma igreja. Nenhuma das propostas avançou. Para que qualquer projeto saísse do papel, seria necessário suprimir árvores centenárias do terreno, e uma denúncia feita pelo movimento Casa do Dr. Silveirinha ao Ministério do Meio Ambiente barrou a autorização e congelou o negócio.
O empresário comandou a fábrica até 2004, ano em que o empreendimento que marcou gerações encerrou as operações. Apesar disso, a família permaneceu proprietária do conjunto imobiliário, hoje alugado para a Allos, sucessora da antiga Aliansce e administradora do Bangu Shopping. A herança industrial se mantém também fora da capital: ainda existem bens ligados ao setor têxtil sob domínio dos Haddad em Petrópolis.