Preocupação com meio ambiente viabiliza negócios lucrativos na construção civil
em Estadão, 11/novembro
Empresas investem em ações com responsabilidade ambiental para atrair clientes e rentabilidade.
De pauta periférica a pilar fundamental, a busca por sustentabilidade é um dos principais agentes de transformação da construção civil nas últimas décadas. As cobranças do poder público e da sociedade têm direcionado o setor para a descarbonização e para adoção de práticas ecologicamente corretas.
À medida que construtoras se adaptam às demandas socioambientais, empresas embarcam em um lucrativo mercado. A GT Building, construtora fundada há pouco mais de cinco anos, é fruto destas reivindicações.
A companhia desenvolve empreendimentos sustentáveis e de alto padrão na cidade de Curitiba, no Paraná. “Não basta colocar um vaso de planta na janela, é preciso tornar o consumo de energia mais eficiente, compensar a emissão de carbono e mitigar a produção de resíduos”, enumera Rodolfo Baggio, diretor comercial da empresa.
Um retrato deste propósito é o The Pineyards, projeto anunciado pela construtora que prevê a neutralização de 100% do carbono emitido durante a obra. A empresa também propõe a compostagem de todos os resíduos gerados no canteiro de obras, a troca de fornecedores por parceiros menos poluentes e até a compra de crédito de carbono.
“Ao fim desta entrega, teremos neutralizado 3,5 toneladas, mas adotamos práticas sustentáveis em toda a empresa”, comenta Baggio. “Não vamos imprimir panfletos do empreendimento, escolhemos fornecedores de regiões próximas para diminuir a poluição do transporte e investimos em um sistema de reutilização da água da chuva no abastecimento das fontes para descargas e lavagem de calçadas”, acrescenta.
Apelo sustentável
Localizado no bairro Cabral, o empreendimento será composto por duas torres de oito pavimentos e apartamentos de 123 a 151 metros quadrados, além de duas unidades tipo garden e duplex, com 232 e 380 metros quadrados, respectivamente. Todos os apartamentos possuem duas vagas de garagem, uma delas equipada com ponto de recarga para veículos elétricos.
Na fachada, os elementos metálicos são revestidos por madeira ecológica. O terreno de 2,7 mil m² também vai abrigar um campo de golf indoor, piscinas interna aquecida e externa, academia, brinquedoteca, pet place, horta, salão de festas, quadra de beach tennis e um solarium.
Com VGV de R$ 115 milhões, o empreendimento será entregue com bicicletas elétricas que os moradores poderão utilizar livremente.
A tecnologia também é uma aliada da empresa na busca por manter o rótulo de empresa sustentável. “Com determinados softwares, conseguimos medir o conforto térmico dos cômodos. Assim, se a gente troca a esquadria ou aumentamos a janela, sabemos se isso vai melhorar o conforto térmico e diminuir o consumo de energia”, ilustra Baggio.
E ele garante que essas práticas não comprometem o orçamento da obra. “Se preocupar com o meio ambiente não demanda mais dinheiro. Investir 200 mil reais a mais em uma obra de 200 milhões não significa que será mais caro. Na prática, um apartamento sustentável não deve custar mais do que 1% de um não sustentável”, garante o executivo.
Também é com a promessa de que a sustentabilidade não está associada a custos maiores que a Lightwall tenta mitigar o uso de tijolo e cimento nos canteiros de obra. Fundada em Recife, capital do Pernambuco, a empresa produz painéis modulares construídos com concreto leve, isopor e água.
“Como os painéis são fabricados a partir da demanda da incorporadora, este é um produto que não gera nenhum resíduo sólido. Enquanto para construir um metro quadrado de alvenaria são quase 500 litros de água, gasta-se 5 litros com este método; se eu for construir 100 m² de parede, perco 20 m² de materiais. Aqui, a perda é de 0,5%”, afirma Marcus Fernandes, CEO da Lightwall.
A estratégia vem trazendo bons frutos. Em setembro deste ano, a companhia abriu uma fábrica em Rio Claro, no interior de São Paulo, com capacidade para produzir 20 mil casas por ano. Até o próximo ano, a expectativa é de abertura de mais 5 unidades, com um investimento de R$ 220 milhões.
Mercado conservador
Fernandes explica que as maiores dificuldades da Lightwall não estão relacionadas aos custos de produção, mas ao conservadorismo do mercado imobiliário.
“Como era a aviação e o automobilismo há 100 anos? E como é hoje? A construção civil não evoluiu quase nada na forma de se construir e o meio ambiente sofre com isso. Ainda é tijolo por tijolo, argamassa e cimento. Parte da jornada de quem trabalha com inovação neste setor é quebrar objeções”, argumenta.
Dados do Relatório de Status Global para Edificações e Construção, publicado em 2022 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Aliança Global para Edificações e Construção (GlobalABC), mostra que o setor de edificações e construção foi responsável por cerca de 21% das emissões globais de gases de efeito estufa.
Naquele ano, os edifícios foram responsáveis por 34% da demanda global de energia e 37% das emissões de dióxido de carbono (CO2) relacionadas a energia e processos. Não à toa, a expectativa de quem atua no setor é que medidas para abrandar estes efeitos se tornem cada vez mais populares.
Assim, enquanto os efeitos das mudanças climáticas se tornam mais visíveis, as iniciativas sustentáveis devem ganhar mercado. “Já é difícil encontrar apartamentos de R$ 1,5 mi a R$ 2 milhões que não tenham selos ou sigam práticas ambientais em alguma etapa da jornada de construção”, comenta Baggio.
“O mercado está se habituando e conhecendo. Talvez só não esteja totalmente disposto a pagar por isso ainda”, observa. “Ao passo que o Brasil regula mais o tema, as incorporadoras que não fazem nada ou fazem muito pouco desenvolvem mais projetos adequados às questões climáticas”, defende.
Ver online: Estadão