Praias agrestes estão na mira do mercado

em Valor Econômico, 14/março

Pequenas baías de mar limpo e natureza preservada são a nova aposta das incorporadoras. Nessas praias, os arranhacéus são proibidos, e o ‘quiet luxury’ é quem dá as cartas.

Não muito distante da badalação que envolve a Praia Central de Balneário Camboriú — onde o vai e vem de carrões esportivos nos finais de semana divide a atenção dos turistas com a altura dos arranha-céus —, está surgindo um outro “BC”: mais discreto, sem prédios e com a natureza como o grande destaque.

São as praias agrestes do município, formadas por pequenas baías de mar com “bandeira azul” — selo global que atesta a qualidade e balneabilidade das águas — e cercadas de costões rochosos, áreas de restinga e Mata Atlântica preservadas.

Laranjeiras, Taquarinhas, Taquaras, Pinho, Estaleiro e Estaleirinho são praias que pertencem à área de proteção ambiental (APA) de Costa Brava, instituída por lei há mais de duas décadas, onde os prédios são proibidos — o gabarito máximo é de três pavimentos —, e a taxa de ocupação permitida é de 40% do terreno.

Ao longo de anos, as restrições afastaram a especulação imobiliária e acabaram por preservar esse trecho do litoral. Agora, com a valorização da qualidade de vida associada à natureza, o problema virou solução, desencadeando uma corrida pela aquisição de terrenos naquelas áreas.

A Praia do Estaleiro foi a primeira a receber projetos. “O mercado da região estava devendo esse tipo de produto mais autoral e sofisticado”, afirma Thiago Cabral, CEO da ABC Empreendimentos, que desenvolve o condomínio Ená, com seis mansões suspensas, concebido pelo arquiteto Jayme Bernardo.

O metro quadrado ali custa R$ 55 mil, mas Cabral acredita que deve superar a casa dos três dígitos até o final das obras. “É um produto para clientes que valorizam o verde, o pé na areia, uma rede de serviços por perto e até gostam do agito urbano, mas não no bairro em que dormem”, define.

Quem está chegando com tudo à Estaleiro é a incorporadora Blue Heaven. São três projetos de altíssimo padrão: Monolyt e Aquos, assinados por Greg Bousquet, do Architects Office; e um terceiro ainda sem nome definido, que ficará a cargo de Marcio Kogan, do Studio MK27. O paisagismo terá a marca de Rodrigo Oliveira. O VGV conjunto dos empreendimentos é de R$ 750 milhões.

“Essa característica fará de Estaleiro a orla mais sofisticada do Brasil. Será uma galeria de design a céu aberto”, comemora Fabricio Bellini, CEO da Blue Heaven.

Para o corretor imobiliário Bruno Cassola, especialista em alto padrão no município, o trecho tem tudo para agradar aos paulistanos. “É um perfil de comprador que valoriza a arquitetura e quer curtir a praia em paz, em uma área quase privativa”, define.

Efeito BC

A busca por alternativas nas praias agrestes é só um dos reflexos do “efeito BC”. Cidades do entorno, como Itapema, Itajaí e Porto Belo, aproveitam-se do sucesso do vizinho famoso. Itapema já tem o segundo metro quadrado residencial mais caro do Brasil, segundo o Índice FipeZap: R$ 13.592, atrás apenas de BC, com R$ 14.041. No mesmo estudo, Itajaí aparece em quarto lugar: R$ 12.008 de valor médio.

O padrão dos empreendimentos também decolou. O Edify One, que tem como sócio a família do jogador Neymar Jr., é um triple A em construção de frente para o mar na Meia Praia, em Itapema. São 60 apartamentos de 264 a 966 metros quadrados, que chegam a R$ 40 milhões cada. As “amenities” incluem piscina projetada pela arquiteta Patricia Totaro e sistemas de segurança e automação suportados por inteligência artificial.

“Para competir com os preços de Balneário, precisávamos fazer algo a mais. A única maneira foi investir em um projeto triple A”, afirma Luiz Feitosa, sócio na incorporadora.

Com 35 anos de mercado, a construtora J.A. Russi aposta em “home resorts” para atrair famílias e veranistas a Itapema. No projeto Saint John, com entrega para 2028, o destaque fica por conta do lazer dividido em dois pavimentos: no sétimo andar ficará um pub, salão de festas com parrilla, academia e brinquedoteca. Já o rooftop, a 108 metros do chão, abrigará piscinas aquecidas, sauna úmida e lounge assinado pelo arquiteto Carlos Rossi.

“Nesse projeto, abrimos mão das coberturas para garantir uma vista livre do oceano a todos os moradores”, explica Suzana J. A. Russi, CEO da empresa.

De olho na supervalorização da vizinhança, a Construtora Pasqualotto mudou o foco de seus investimentos: famosa por desenvolver o Yachthouse by Pininfarina — icônico condomínio com as duas torres residenciais mais altas do país e endereço certo de celebridades em BC —, a companhia agora concentra 80% dos negócios em Itapema e Porto Belo.

“O ritmo de crescimento dessas cidades tem sido intenso, inclusive com a migração de famílias de alta renda em razão da disparada dos preços em Balneário”, analisa Alcino Pasqualotto, CEO da companhia.

O executivo entende que toda a Costa Esmeralda catarinense tende a se transformar no destino ideal dos brasileiros que buscam uma reserva de valor e proteção de patrimônio investindo em uma segunda residência.

“Cerca de 90% do agro nacional já tem apartamento na região, e o pessoal da mineração e da madeira também tem vindo para cá”, afirma.


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