A era dos ‘megaprédios’ chega a São Paulo
em Valor Econômico, 6/setembro
Com expertise ‘importada’ de Balneário Camboriú, mercado imobiliário paulistano recebe uma safra de arranha-céus com moradias e escritórios que ficam até a 200 metros de altura.
Nos próximos meses, o mercado imobiliário de São Paulo vai receber uma série de lançamentos cujo denominador comum é a altura. Serão megaprédios de luxo, com residências e andares comerciais a até 200 metros acima do nível da rua, construídos com know-how e tecnologia desenvolvidos na meca dos arranha-céus no Brasil: Balneário Camboriú, em Santa Catarina.
Incorporadoras e escritórios de arquitetura renomados das duas cidades têm promovido encontros técnicos nos últimos meses para trocar conhecimento e formatar parcerias. O interesse é tanto que uma das companhias catarinenses — a FG Empreendimentos, dona do One Tower, com 290 metros de altura, e do futuro Triumph Tower, com mais de 500 metros — acaba de abrir uma empresa exclusiva na cidade catarinense para prestar esse tipo de consultoria.
"Decidimos criar a FG Talls em função da demanda não só de São Paulo, mas de todo o Brasil e até da América Latina. Dos paulistas, foram mais de dez consultas neste ano. Mas existem interessados da Argentina, do México, do Chile, da Costa Rica e do Uruguai”, afirma Stephane Domeneghini, diretora executiva da consultoria e engenheira especializada nesse tipo de construção.
A empresa foi costurada em sociedade com Fatih Yalniz, VP sênior do escritório americano de engenharia WSP-USA e nome forte por trás de edificações como One WTC e 432 Park Avenue, em Nova York.
O CEO da FG, Jean Graciola, acredita que a revisão recente feita nos planos diretores de diversas cidades brasileiras — permitindo construções mais elevadas — deverá dar escala à nova operação mais rapidamente. “Temos um vasto conhecimento sobre prédios altos e vamos comercializar esse ativo, disponibilizando viabilidade de projetos, estudos inovadores e parcerias”, diz Graciola.
NYC é aqui
De fato, esses empreendimentos ocuparão áreas nas zonas eixo de transformação urbana (ZEUs) da capital paulista, onde o potencial construtivo previsto no Plano Diretor Estratégico ficou maior. “Com o aumento no coeficiente de aproveitamento das regiões, é natural que comece a ocorrer uma hiperverticalização dos projetos”, explica Grazzieli Gomes, sócia-diretora da aflalo/gasperini arquitetos.
Nas pranchetas do escritório paulistano, existem pelo menos quatro projetos de arranha-céus acima dos 200 metros de altura em desenvolvimento — todos mantidos em sigilo. “São Paulo é uma cidade cosmopolita, a Nova York da América Latina, e não tem motivo para não ter prédios assim”, compara Grazzieli.
Alguns empreendimentos estão em fase mais adiantada. Na Chácara Santo Antônio, na Zona Sul, o Complexo Alto das Nações terá a torre corporativa mais alta: com 219 metros de altura. Ela divide o mesmo terreno com uma torre mista e outra residencial — a última, com 116 metros acima do nível da rua.
O arquiteto Jonas Birger assina o edifício de apartamentos — uma parceria da Eztec e da Lindenberg — com 38 pavimentos e lazer no topo do prédio. Segundo ele, o Lindenberg Alto das Nações terá um “rooftop” com pé-direito triplo todo envidraçado, piscina coberta climatizada, quadra de tênis oficial, “sky lounge”, área fitness e bar.
“A chegada dos megaprédios deverá beneficiar o segmento de alto padrão. A vista livre da cidade é uma moeda forte e deve valorizar os apartamentos nos andares mais altos de forma expressiva”, diz Birger.
Com VGV de R$ 569,7 milhões, o empreendimento foi lançado há uma semana e já tem fila de interessados nas unidades mais altas. “Os clientes que valorizam vistas amplas logo buscam esses apartamentos. A altura funciona como um agregador de valor ao preço do metro quadrado, ainda mais quando se tem o espaço de lazer completo logo acima”, explica Tellio Totaro, superintendente executivo de Incorporação da Eztec.
Ainda mais alto, o PG Residences, da Benx Incorporadora, que fica no Parque Global, na Zona Sul, promete apartamentos a 173 metros de altura. Serão quase 300 unidades, entre 77 e 311 metros quadrados, no caso das coberturas. Com VGV de R$ 800 milhões, o empreendimento já tem cerca de 60% das unidades vendidas.
Estabilidade, vento e elevadores são desafios a superar
A construção de prédios superaltos tem dificuldades específicas que exigem uma série de testes, e os edifícios devem ter uma boa relação com as cidades
Engenheira especializada em edifícios superaltos, Stephane Domeneghini, diretora da FG Talls, afirma que o maior desafio desse tipo de construção é a estrutura, principal sistema de segurança do prédio, responsável por mantê-lo de pé. “Quando se trata de um arranha-céu, manter a estabilidade e vibrações dentro de parâmetros aceitáveis é um desafio para poucos profissionais no mundo”, destaca.
Segundo ela, o projeto dos elevadores, da fachada — que recebe o primeiro impacto do vento —, do sistema de prevenção de incêndio e do abastecimento de água e energia é completamente diferente do de um prédio convencional.
Além dos testes de praxe, Stephane destaca a necessidade de se fazer a investigação geotécnica do terreno e do tipo de concreto ideal, além do teste de carga, para entender o comportamento da fundação. Essencial para o conforto das pessoas, é feito também o teste de túnel de vento.
O incorporador deve levar em consideração três pontos essenciais antes de optar por um “super tall”: o tipo de terreno, a validação estrutural e a viabilidade econômica de uma obra dessa dimensão. “Isso envolve previsão de custos e análise logística, ciclo de lajes e quantidade de mão de obra habilitada para o trabalho”, detalha ela.
Prédios superaltos representam um desafio para o planejamento urbano e não podem ser pensados isoladamente, ressalta Stephane. “Entender da infraestrutura de abastecimento, medir o impacto no entorno e dar clareza sobre aspectos positivos da verticalização bem planejada exige diálogo junto a órgãos públicos, comunidade e mídia, e devemos trabalhar aspectos de mitigação por meio de medidas sustentáveis desde a fase conceitual”, conclui.
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