Mudança na tributação de imóveis pela Reforma Tributária abre espaço para descontos no ITBI. Entenda

em O Globo, 15/agosto

Imposto poderá ser pago antecipadamente com valor menor do que o que seria cobrado na transmissão para o novo proprietário. Tributaristas avaliam pontos controversos.

A segunda etapa da regulamentação da Reforma Tributária vai alterar a cobrança do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), de competência municipal, e as regras para definir o valor dos imóveis sobre o qual incide o tributo devem gerar controvérsias, alertaram tributaristas.

Segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO, uma mudança de última hora, feita na terça-feira, evitou que as alterações afrontassem diretamente decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema.

Na proposta original estava previsto que o ITBI passaria a ser cobrado nos atos de compra e venda dos imóveis. Ou seja, o comprador teria que pagar o tributo ao assinar a escritura junto com o vendedor.

A alteração de última hora prevê que o imposto seja devido nas transmissões de propriedade como já ocorre hoje, mas municípios e o Distrito Federal, que recolhem o imposto, podem prever a “antecipação do pagamento”. O contribuinte decidirá se quer ou não antecipar, e os governos locais podem oferecer desconto na alíquota, incentivando a antecipação.

A votação do projeto que prevê as mudanças seria concluída ontem na Câmara, mas foi adiada. O texto ainda terá de receber o aval do Senado antes de entrar em vigor.

Risco corrigido

Segundo Wallace Wu, advogado especialista em direito imobiliário do escritório Kincaid Mendes Vianna, legislações municipais e cartórios, muitas vezes, exigiam o pagamento do ITBI para registrar as escrituras de compra e venda, mas o tema sempre foi controverso. Há anos a controvérsia era objeto de ações judiciais, até chegar ao STF.

A Corte definiu que o ITBI é devido apenas no registro final da escritura. A tributarista Vivian Casanova, do escritório BMA Advogados, diz que a proposta original da regulamentação impunha cobrança do ITBI para um ato que não caracteriza a transferência da propriedade:

— Corrigiram um risco de inconstitucionalidade. Agora, o imposto vai incidir no registro no RGI, mas, opcionalmente, o contribuinte pode antecipar o recolhimento para o momento em que formaliza a compra e venda.

Mas ainda há problemas na definição do valor sobre o qual o tributo recai, avalia o tributarista Gustavo Brigagão, do escritório Brigagão Duque Estrada Advogados. Geralmente, nas legislações municipais, o ITBI e o IPTU são cobrados sobre o “valor venal” dos imóveis, atribuído pelas prefeituras.

Mas, segundo Brigagão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu definitivamente que o ITBI deve incidir sobre o valor da operação informado pelo comprador e o vendedor. E decidiu que o valor não está vinculado ao usado para calcular o IPTU. E, havendo controvérsia sobre o valor, é o Fisco municipal que deve abrir processo sobre o caso.

— O projeto coloca com todas as letras que, havendo discordância, caberá ao contribuinte comprovar o correto valor de mercado. Isso é muito complicado. O contribuinte vai ter que ver valores de mercado, contratar empresas especializadas — afirmou Brigagão.

Dividendos

Outro ponto de alerta entre tributaristas é o das alterações do ITCMD, o imposto estadual sobre heranças e doações. A regulamentação introduz a possibilidade de o tributo recair sobre dividendos que são distribuídos de forma desproporcional. É um ponto que afeta empresas limitadas, como escritórios de advocacia, consultorias e firmas de engenharia.

Segundo o advogado Alessandro Fonseca, do escritório Mattos Filho, a legislação permite que apenas as empresas limitadas façam distribuição desproporcional dos lucros. Serve para casos em que um dos sócios, eventualmente, faça jus a receber mais — por exemplo, quando trabalhou mais :

— A distribuição de lucros não é um evento alcançável pelo ITCMD. O que é doação? É um ato voluntário.

Mudanças aprovadas que seguem para o Senado

Qual a alíquota do ITBI?

O imposto é municipal e não tem um padrão nacional. Segundo especialistas, costuma variar entre 2% e 5% do valor do imóvel. Em Rio, São Paulo e Porto Alegre é 3%, em Vitória é 2%. A regulamentação da Reforma Tributária não muda isso.

Quando o ITBI é pago?

Prefeituras e cartórios exigiam o pagamento na assinatura da escritura de compra e venda, mas o STF definiu que o contribuinte (geralmente, o comprador) pode pagar só no registro da escritura no Registro Geral de Imóveis (RGI).

O que muda?

A regulamentação mantém o pagamento no registro da escritura no RGI, mas permite que municípios e o Distrito Federal ofereçam desconto na alíquota do ITBI para o contribuinte que optar por pagar na assinatura da escritura. Cada governo local terá que aprovar em lei suas regras para esse desconto.

Sobre qual valor recai o ITBI?

O imposto é cobrado sobre o “valor venal” do imóvel, definido pelo fisco municipal, com o intuito de seguir os preços de mercado. O tema é controverso quando há diferença para o preço de venda. O STJ definiu que o ITBI deve ser cobrado sobre o preço da operação e, quando há divergência, o fisco local é responsável por provar qual o certo.

O que muda?

A regulamentação define melhor o que é “valor venal”, mas estabelece que, nos casos de diferença para o preço de venda, o contribuinte, geralmente o comprador, é quem deve provar qual o certo.


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